quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Lua Azul, Ano Novo

Se a chuva der uma trégua, vamos receber 2010 à luz de uma "lua azul" - nome que se dá à segunda lua cheia de um mesmo mês. A próxima vez que isto vai acontecer será em agosto de 2012. Inspirada nesse fenômeno, deixo como lembrança de final de ano este clipe da música Blue Moon com o grupo The Marcels. Aproveitem o ano novo!



terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O fator fé

O Raul, meu colega de Seminário (atualmente em "licença-paternidade"), deixou o seguinte comentário no meu post sobre o livro Missão Transformadora:

"quanto a sua última resposta de incerteza gostaria de lhe fazer uma pergunta: e o fator FÉ?"


A "última resposta de incerteza", creio, seria este trecho:

Para mim, porém, o apelo às "Escrituras" ou à tradição fala cada vez menos. Não posso mais defender a superioridade do cristianismo sobre outras religiões (ou sobre a "não religião", por falar nisso). E, no momento, não me sinto capaz de aderir incondicionalmente a qualquer doutrina cristã...


Caro Raul, o "fator fé" é justamente parte do problema. A fé cristã não é única e imutável, existem diversas fés possíveis, e cada uma delas encontra apoio em uma interpretação da Bíblia. Há cristãos sinceros que defendem que Deus determinou que X pessoas serão salvas e Y pessoas serão condenadas ao inferno. Há cristãos sinceros que acreditam que a salvação depende exclusivamente de uma decisão pessoal. Houve cristãos sinceros que acreditavam que obrigar alguém a se converter é um ato de amor - hoje, ninguém mais defenderia isto (pelo menos não em público). Há cristãos sinceros que acreditam que Deus está matando soldados no Iraque para punir quem tolera os gays, há cristãos sinceros que são homossexuais. Como saber qual destas posturas é a correta? O que significa esse "fator fé"?

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Nota Rápida: Natal Sem Fome

Saiu hoje no Globo: a campanha Natal Sem Fome dos Sonhos, da ONG Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida, arrecadou até o momento apenas 54% do total alcançado em 2008. O objetivo da campanha é obter livros e brinquedos para crianças pobres - os livros integrarão Espaços de Leitura, carrinhos que circulam por comunidades carentes para estimular a formação de leitores.

Para ajudar, é só procurar um dos postos de coleta ou fazer um depósito na conta da Ação da Cidadania (Banco do Brasil, Agência 1211-4, Conta Corrente 500537-X). Mas atenção: faltam apenas 2 dias para o encerramento da campanha, e a entrega das "Cestas dos Sonhos"deve acontecer no próximo sábado, dia 19/12.

domingo, 8 de novembro de 2009

Estou lendo Missão Transformadora, de David J. Bosch (3. edição, Ed. Sinodal, 2009), para a disciplina Fundamentos da Missão. Destaco aqui alguns trechos do capítulo 5, Mudanças de paradigma na missiologia, que me fizeram pensar...


É claro que sempre houve cristãos (e teólogos!) que achavam que sua compreensão da fé era "objetivamente" exata e, deveras, a única interpretação autêntica do cristianismo. Tal atitude, no entanto, baseia-se numa perigosa ilusão. Nossos pontos de vista constituem sempre meras interpretações do que consideramos ser a revelação divina, não a revelação divina em si (e essas interpretações são profundamente configuradas por nossas autocompreensões). Sustentei, nos capítulos precedentes, que nem mesmo os livros bíblicos que examinamos são, como tais, registros da revelação divina; eles constituem interpretações dessa revelação. [...] Ninguém recebe o evangelho de maneira passiva; cada qual, naturalmente, reinterpreta-o. [p. 228, grifo do autor]
De fato, sempre houve (e há!) cristãos que consideram que suas compreensões da fé são as únicas autênticas. E, geralmente, todos apelam para a Bíblia para justificar essas compreensões. Se aceitamos a visão de Bosch (que é também a opinião de muitos teólogos) de que os próprios livros bíblicos não são registros, mas interpretações da revelação, dá para entender porque grupos tão diferentes quanto calvinistas e arminianos ou carismáticos e "tradicionais" conseguem justificar-se biblicamente. A Bíblia não é homogênea, ela contém diferentes visões de mundo, de Deus, da igreja e da fé.

Até aqui, tudo bem - o autor mantém sua coerência. Vejamos o próximo trecho.

Em vez de ver minha própria interpretação como absolutamente correta e todas as demais, por definição, como errôneas, reconheço que diferentes interpretações teológicas, incluindo a minha, refletem contextos, perspectivas e vieses distintos. Isso não significa, todavia, que eu considere todas as posições teológicas igualmente válidas ou que aquilo em que as pessoas crêem não tem importância. Pelo contrário. Farei o possível para compartilhar minha compreensão de fé com outros, enquanto lhes concedo o direito de fazer o mesmo. Entendo que minha abordagem teológica é um 'mapa', e que um mapa jamais constitui o 'território' em si (...). Embora eu creia que meu mapa seja o melhor, aceito que haja outros e que, pelo menos em teoria, um desses mapas possa ser melhor que o meu, visto que só tenho acesso a um conhecimento parcial (cf. 1Co 13.12). [p. 234]
Acho que aqui as coisas começam a se enrolar. Se aceitamos que "diferentes interpretações teológicas (...) refletem contextos, perspectivas e vieses distintos", que critério podemos usar para determinar que posições são válidas? Gosto da metáfora dos mapas, mas, neste caso, temos que admitir que nenhum de nós tem acesso ao território. Se só tenho em mãos os mapas, que critérios posso usar para dizer qual deles é adequado? No máximo, eu posso dizer que um mapa é incoerente porque usa duas escalas ao mesmo tempo, por exemplo. Mas, retiradas estas inconsistências técnicas, como determinar qual mapa representa melhor o território?

No parágrafo seguinte, a meu ver, Bosch se mete num beco-sem-saída:

Para a pessoa cristã, isto significa que qualquer mudança de paradigma só pode ocorrer com base no evangelho e por causa do evangelho, porém jamais contra ele (...). Ao contrário das ciências naturais, a teologia se relaciona não só com o presente e o futuro, mas também com o passado, a tradição, o testemunho primordial de Deus aos seres humanos (...). Não há dúvida de que a teologia sempre precisa ser relevante e contextual (...), contudo nunca se pode buscar isso a expensas da revelação de Deus na história de Israel e através dela e, principalmente, no evento de Jesus Cristo (...). Os cristãos levam a sério a prioridade epistemológica de seu texto clássico, as Escrituras. [p. 234]

Admito que não entendo exatamente o que quer dizer "prioridade epistemológica". Mas, a julgar pelo contexto, dá para ver que Bosch tenta reestabelecer a Bíblia como referencial para julgar a validade de posições teológicas. A revelação seria o território, e a ela devemos comparar nossos mapas. E aí a porca torce o rabo: já de início nós admitimos que não temos acesso direto a essa revelação. Na página 228, ele afirma que "na mais antiga tradição de Jesus, os ditos de Jesus já eram afirmações sobre Jesus" (grifos do autor). Como pode, agora, defender que a teologia não pode prescindir da revelação de Deus no evento de Jesus Cristo?

Verdade seja dita: Bosch percebe o que está fazendo e tenta se consertar no parágrafo seguinte.

Sei que, com a afirmação acima, dificilmente solucionei qualquer problema. As Escrituras vêm a nós em forma de palavras humanas, que já são "contextuais" (no sentido de terem sido redigidas para contextos históricos muito específicos) e, ademais, suscetíveis de interpretações distintas. Mas, ao fazer essa afirmação, estou sugerindo um "ponto de orientação" que todas as pessoas cristãs compartilham (ou deveriam compartilhar) e a partir do qual o diálogo entre elas se viabiliza. Nenhum indivíduo ou grupo possui aqui um monopólio. Assim, a igreja cristã deveria funcionar como uma "comunidade hermenêutica internacional" (...) em que cristãos (e teólogos) de diferentes contextos questionam, reciprocamente, seus vieses culturais, sociais e ideológicos. [p. 234]

Ok: a Bíblia pode servir como critério para avaliação das formulações de fé cristãs. Claro que, se ela mesma permite intepretações distintas e válidas, o mesmo valerá para as interpretações contemporâneas da fé: diferentes teologias e doutrinas poderão conviver e dialogar entre si. Tudo muito bom, tudo muito bem... Mas e quanto às pessoas e aos grupos fora dos nossos "arraiais"? As interpretações judaicas/ateístas/agnósticas/budistas/islâmicas/espíritas/xintoístas (etc.) são automaticamente menos válidas que as nossas? Com base em que poderíamos afirmar isso? Enfatizar o "evento-Cristo" não soluciona a questão: se os evangelistas interpretam e apresentam Jesus de diferentes maneiras igualmente válidas, e as próprias igrejas cristãs fazem o mesmo, como negar a validade das interpretações que judeus, islâmicos, espíritas, budistas (etc) fazem de Jesus?

Como se trata de um livro sobre missiologia, estou curiosa para ver como será tratada a questão da relação entre o cristianismo e outras religiões/cosmovisões... Para mim, porém, o apelo às "Escrituras" ou à tradição fala cada vez menos. Não posso mais defender a superioridade do cristianismo sobre outras religiões (ou sobre a "não religião", por falar nisso). E, no momento, não me sinto capaz de aderir incondicionalmente a qualquer doutrina cristã...

sábado, 7 de novembro de 2009

Supercômicos

Se um dia eu resolver me casar, a nossa "primeira dança" vai ter que ser esta:



Para ver outras versões bizarras de heróis, como os "3 supermen" italianos e a Batwoman mexicana, veja este link. Meu favorito é esta paródia musical filipina (!) de Batman e Robin:



"Praise the Lord! Batman and Robin!"

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Nota Rápida

Começou ontem e vai até o dia 29/11, no CCBB do Rio, a mostra A Elegância de Woody Allen. A minha dica pra este primeiro final de semana da mostra é o Casino Royale de 1967, uma paródia dos filmes de James Bond com elenco estelar: David Niven como o James Bond original (parte da trama envolve uma série de falsos agentes 007, para driblar uma tentativa de assassinato); Orson Welles como o vilão Le Chiffre; Petter Sellers como o especialista em baccará Evelyn Tremble (um dos falsos 007); Woody Allen como Jimmy Bond, sobrinho de James; Ursula Andress (a primeira bondgirl!), Deborah Kerr, Jacqueline Bisset; além de pontas de William Holden, Peter O'Toole, Jean-Paul Belmondo... O filme passa neste domingo, dia 08, às 15h, no Cinema 2 do CCBB. É perfeito pra quem gosta de comédias insanas :-)

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P.S.: Segue o trailler, só pra vocês terem uma ideia do que se trata (vale conferir a música tema, também):

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Vivo em Johannesburgo

Fui ver Distrito 9, do estreante Neil Blomkamp, no sábado passado, depois de ouvir críticas promissoras. Vale cada centavo: fazia tempo que eu não me envolvia tanto com uma história! Além do clima de documentário e da ação, o protagonista Wikus van der Merwe é um dos personagens mais bem-escritos (e interpretados) que vi no cinema nos últimos tempos. Você ri dele, sente pena, tem vontade de dar uns tabefes... Ele começa como um cara meio panaca e cresce aos poucos, fazendo muita bobagem no caminho. Wikus é o primeiro papel de Sharlto Copley, que é excelente. Tomara que ele e o diretor continuem fazendo filmes...

A premissa de Distrito 9 (alienígenas vão parar em Johannesburgo, capital da África do Sul, e acabam virando um problema social) já estava no curta Alive in Joburg, do mesmo diretor - e com uma pequena participação do Sharlto Copley. Detalhe: segundo a Wikipédia, todos os depoimentos que não mencionam explicitamente os alienígenas foram tirados de entrevistas reais com sul-africanos, dando suas opiniões sobre refugiados do Zimbábue.

domingo, 18 de outubro de 2009

Placebo e Música

A New Scientist publicou uma matéria bem detalhada com as descobertas recentes sobre o funcionamento do efeito placebo, vale a pena conferir.

E, pra não perder o hábito, um vídeo musical. Com vocês, o coral esloveno Perpetuum Jazzile cantando "Mas Que Nada", de Jorge Ben.


Na Rede (3)

A Volkswagen lançou o projeto The Fun Theory (A Teoria da Diversão) para mostrar que o jeito mais fácil de provocar mudanças comportamentais positivas é pelo entretenimento. Eles já divulgaram três vídeos (também disponíveis num canal do YouTube) que colocam a teoria em prática: uma escada transformada em piano para estimular as pessoas a deixar a escada-rolante de lado, um coletor de garrafas de vidro para reciclagem que também é um jogo, e o meu favorito (abaixo): a lata de lixo mais funda do mundo :-). Quem tiver boas ideias pode se candidatar ao Fun Theory Award - só me pergunto se eles aceitariam ideias que estimulem as pessoas a trocarem seus carros pelo transporte coletivo... (Dica da Márcia)




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Esta semana, pesquisadores alemães começaram a desvendar um dos mistérios ainda não explicados pela ciência: o efeito placebo. Eles reuniram quinze voluntários saudáveis e anunciaram que aplicariam um creme anestésico em uma de suas mãos e um creme comum na outra. Alguns, porém, só receberam o creme comum. Após a aplicação dos cremes, os voluntários tiveram as mãos espetadas com agulhas. Não só os voluntários que acreditavam ter suas mãos anestesiadas (apesar de só terem recebido o creme comum) tiveram uma redução de 25% na dor, eles também apresentaram redução na atividade do trecho da medula espinhal responsável pelo envio de sinais de dor ao cérebro. Os cientistas sugerem que isto acontece porque, quando os pacientes esperam que um tratamento seja efetivo, a área do cérebro responsável pelo controle da dor é ativada, liberando endorfinas. Estas endorfinas, por sua vez, "instruem" a medula espinhal a suprimir os sinais de dor, fazendo com que os pacientes se sintam bem independente de qualquer efeito direto do tratamento. Não é fascinante? (via Veja e Times Online)

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Fascinante também, além de hipnótico e hilário, é este vídeo japonês (via Videogum):


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Notas rápidas e um convite

Caríssimos: o Coral ANSEncanta vai participar da Festa do Dia das Crianças da Sociedade dos Amigos da Pediatria do Hospital Gaffrée e Guinle (SAPE), que acontece sábado que vem, dia 17 de outubro, no Museu Militar Conde de Linhares. É a segunda apresentação pública do Coral, e a primeira desde que eu comecei a participar dele. O repertório inclui California Dreaming e Esperando na Janela, entre outras. Só o horário desanima: 9h da manhã... Nem minha mãe vai :( Mas fica o convite, caso alguém se anime a madrugar.

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A Conrad lança este mês a versão em quadrinhos do livro de Gênesis ilustrada por Robert Crumb a partir da tradução do Robert Alter. Já está na minha lista de desejos! (Via Carta Capital)

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Saiu no mês passado o site brasileiro do Bookcrossing (que anda parado aqui no Rio). Ficou muito legal, e é totalmente integrado com o site oficial - minha estante, que também anda parada, fica aqui.

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Pra quem gosta de arte urbana (ou de coisas bacanas em geral), este vídeo vale a pena (Via BizarroBlog):




E tá bom pra semana, né?

Tubo de Ensaio Teológico

Outro dia, numa das minhas aulas, foi apresentada a seguinte definição de Teologia: "Sistema de nossos conhecimentos sobre o Ser Supremo". E eu pensei: oras, se Teologia é isso, não é à toa que ela parece tão distante do cotidiano e da prática. Mais: na minha visão, essa definição de Teologia engessa o trabalho dos teólogos. Se o objeto da Teologia é o "Ser Supremo", estamos num buraco sem saída: nosso objeto é, por definição, incompreensível. Pelo menos na tradição cristã, Deus é o "totalmente outro", o insondável, o que não pode ser conhecido. Voltamos os olhos para o céu, já sabendo que nunca poderemos chegar a completar a tarefa - simplesmente porque ela não pode ser completada.

Ah, sim, temos a Revelação registrada na Bíblia, uma fonte segura para o trabalho teológico. O problema é que a Bíblia não é um tratado teológico sistematizado. Ela se parece mais com uma biblioteca, uma coleção de textos de diferentes origens, escritos por diferentes autores, com diferentes propósitos, para diferentes comunidades, usando todo tipo de gênero literário - da narrativa à lei, de cartas a poemas. Não é de se surpreender que doutrinas muito diversas entre si possam ostentar o título de "bíblicas". Quem quiser pode encontrar, na mesma Bíblia, textos para sustentar posições totalmente opostas. Que isso aconteça com as ideias sobre quando (ou se) acontecerá o arrebatamento, tudo bem. Mas e quanto ao calvinismo e ao arminianismo, por exemplo? Um Deus que predetermina todos os acontecimentos, inclusive quem será salvo ou não, é radicalmente diferente de um Deus que concede a suas criaturas o livre-arbítrio para aceitar ou não sua oferta de salvação.

Definitivamente, aquela definição de Teologia não me serve. Pode até ser etimologicamente correta (Theos = Deus, Logos = palavra, estudo --> Teologia = Estudo sobre Deus), mas eu sou bibliotecária e estou acostumada a superar etimologias (Biblio = livro, Theke = caixa, estante --> Biblioteca = caixa de livros). Por outro lado, ainda estou no meio da minha graduação, e seria pretensioso tentar redefinir toda a Teologia, jogando fora o trabalho de séculos (milênios, até) dos que vieram antes de mim. Só preciso de uma definição possível, uma hipótese de trabalho para seguir em frente sabendo que o próprio trabalho deverá trazer elementos que modifiquem, ampliem ou reduzam o escopo dessa definição.

Como teóloga, quero tirar os olhos do céu e trazê-los para a terra. Não quero produzir um sistema de conhecimentos sobre um ser supremo que é, por definição, inatingível. Quero, sim, compreender as ideias humanas sobre o divino, o sagrado, o mistério; e verificar como estas ideias afetam os relacionamentos entre os seres humanos.

Eu adoraria ouvir seus comentários: para vocês (especialmente os não-teólogos), que Teologia é possível?

Carta à empresa Metrô Rio

Texto de e-mail que acabo de enviar à empresa Metrô Rio, reclamando do novo sistema de cartão eletrônico para as integrações expressas:

Gostaria de registrar minha insatisfação com o novo sistema cartão eletrônico para a integração Ônibus/Metrô Expresso. Moro em Botafogo, nas proximidades do Rio Sul, e estudo à noite na Tijuca. Uso diariamente a linha 511A, que liga a estação de Botafogo à Urca. Antes da implantação do sistema eletrônico, já era imposta a limitação na venda dos bilhetes expressos, forçando os usuários dessas integrações a ir diariamente à bilheteria. Como o intervalo entre os trens e ônibus expressos é maior durante a noite, muitas vezes a ida à bilheteria significava perder o trem e chegar em casa mais tarde.

Ao contrário do que dizem os cartazes de propaganda, a vida do cliente não ficou mais prática com a implantação dos cartões eletrônicos. Na verdade, vocês conseguiram piorar um sistema que já não era ideal. A limitação de uso em duas horas impede de vez a prática de comprar bilhetes antecipadamente (na hora do almoço, por exemplo), única forma de tentar poupar tempo à noite.

O pior de tudo é que a limitação de tempo não faz o menor sentido: o motorista que recebe os cartões no ônibus expresso não tem qualquer forma de verificar há quanto tempo o bilhete foi comprado. Fica a impressão de que o novo sistema não foi pensado para facilitar a vida dos usuários, mas a da própria empresa.
Veremos se terei resposta... As integrações expressas são uma verdadeira mão-na-roda: em vez de pagar 2,80 pelo metrô da Saens Peña a Botafogo, e mais 2,20 pelo ônibus até a minha casa (ou de me arriscar pegando um dos ônibus da Tijuca a Botafogo, passando por uma série de locais de risco), pago 3,60 pela integração. No entanto, praticamente todas as praticidades que vêm sido oferecidas aos usuários de ônibus e metrô passam longe da gente. O Vale-Transporte Eletrônico seria a única opção para não perder dinheiro, mas achei o site da Fetranspor tão confuso que desisti... E afinal, o tal do Bilhete Único sai ou não sai?

domingo, 11 de outubro de 2009

Preciosas Ilusões...



A moça é a cantora e compositora Regina Spektor. A música é Eet, de Far, seu último álbum. E a razão para eu postar o vídeo são estes versos:
It's like forgetting the words to your favorite song.
You can't believe it; you were always singing along.
It was so easy and the words so sweet.
You can't remember; you try to move your feet.
It was so easy and the words so sweet.
You can't remember; you try to feel the beat...
Me lembro de quando ouvi esta música na minha última viagem a Belo Horizonte, sozinha no ônibus que me levou de Confins à Pampulha. Não foi a primeira vez que ouvi, mas foi só lá que me dei conta do quanto esta música tem a ver com o que estou vivendo. Hoje encontrei o vídeo e o sentimento voltou. É mesmo como esquecer a letra da minha música favorita, que eu sempre cantava junto. Era tão fácil, e as palavras tão doces... Mas não consigo me lembrar, por mais que tente mexer os pés e sentir a batida...

Sim, era tão fácil, tão doce, fechar os olhos e cantar junto... Mas agora meus pés parecem ter esquecido a batida (ok, metáfora ruim: sempre tive dois pés esquerdos, rs), as palavras fogem da língua, as doutrinas escapam pelos meus dedos. E eu sinto, ao mesmo tempo, alívio e saudade.

Alívio, porque as doutrinas e tradições eram um peso. Não que eu me sentisse oprimida ou amordaçada por elas - cresci num ambiente nada fundamentalista, e aprendi rápido a colocar em perspectiva comentários como "Ouvir música do mundo/Faltar a Igreja/etc, etc, etc é pecado". E sempre fui uma "boa menina", em geral, sem grandes rebeldias adolescentes.

Não, não sou um dos muitos feridos em nome de Deus. Mas as doutrinas eram os óculos que eu usava para ler a Bíblia e o mundo. Eu podia até perceber que eles não funcionavam muito bem para ler o mundo, mas foi preciso ir ao Seminário para que caísse a ficha de que os óculos também não serviam para ler a Bíblia.

Me disseram que a Bíblia É a Palavra de Deus, que era absurdo dizer que ela "contém" a Palavra. E eu pensava, quietinha comigo, sem ousar dizer as palavras: "Mas peraí, pra que Deus ia querer aquele monte de genealogias em 1Crônicas??" Bobagens de adolescente, talvez. Mas comecei a estudar Teologia, e conhecer uma outra perspectiva sobre a Bíblia. Livre do peso de ser "A Palavra de Deus", ela já não se apresenta a mim como um livro narrando uma única história (o plano da salvação), mas uma coletânea de textos que dialogam e combatem entre si, testemunhos das crenças, dúvidas, lutas e paixões de pessoas que viveram num mundo muito diferente do meu, mas que, como eu, amaram, choraram, odiaram, cantaram, riram... Pra mim, a Bíblia só ganha com isso. E meus olhos brilham ao vê-la diante de mim, pedindo para ser explorada - não para encontrar nela as doutrinas que eu já tinha, mas para ouvir vozes de um passado tão distante que só pode chegar até mim em fragmentos que eu provavelmente nunca serei capaz de juntar num quadro único e coerente.

Mas tenho saudades... Saudades do tempo em que eu sabia direitinho a letra da música, saudades das minhas certezas, saudades dos meus mitos. Não, não quero abandoná-los todos, não agora, mas eles me escapam. E sinto, desde já, saudades destas preciosas ilusões, que não me deixaram na mão quando eu estava indefesa. Abandoná-las é como dizer adeus a amigos de infância...

but this won't work now the way it once did
and I won't keep it up even though I would love to
once I know who I'm not then I'll know who I am
but I know I won't keep on playing the victim

these precious illusions in my head did not let me down when I was defenseless
and parting with them is like parting with invisible best friends
<...>
and though I know who I'm not I still don't know who I am
but I know I won't keep on playing the victim

these precious illusions in my head did not let me down when I was a kid
and parting with them is like parting with a childhood best friend
-------
P.S.: Enquanto eu procurava o vídeo desta última música, encontrei este cover de My Humps, do Black Eyed Peas. Perfeito pra colocar um tom mais alegre neste post :-)

Did I Step On Your Trumpet?



Com vocês, Danielson - uma das bandas cristãs mais bacanas que eu conheço. A letra completa da música está no site.

"Be just who you're made to be / Papa is so mighty pleased with thee"

domingo, 27 de setembro de 2009

Comentar com os que comentam

Não imaginava que meu breve comentário sobre Romanos 12.15 no final de um post sobre a última assembleia da ELCA fosse render tanto... Mas os comentários continuam chegando, e fico tão animada de ver que alguém me lê que não quero deixar a peteca cair. Continuemos, então.

Pelo Facebook, minha amiga Luciana (que conheço desde a terceira série!) fez a defesa da Pollyana:


Eu nunca entendi a Pollyanna como alguém que nunca ficou triste. A Pollyanna sentia as coisas que davam errado com ela, sim. Mas ela conseguia ver que aquilo não era a pior coisa do mundo nem a última a acontecer na vida.
<...> Acredito que otimismo e empatia caminham juntos. Nada mais chato que estar triste e chegar um amigo que ao invés de te consolar vai te falar que as coisas estão ruim mesmo. E quando as escrituras nos ensinam a chorar com os que choram, elas nos ensinam como o consolo deve ser. Não um deixa disso, mas estar presente na hora necessária com um coração solícito e compreensivo.
Assino embaixo, Lu. Quando eu disse que "Chorar com os que choram é deixar de ser Pollyanna", tinha em mente os exageros cometidos em nome do otimismo. É verdade que é horrível ter ao seu lado uma hiena pessimista ou um andróide paranóide que só sabe dizer que tá tudo cinza, vai dar tudo errado, ó céus, ó vida, ó azar. Mas também é ruim quando quem tenta nos consolar parece desprezar a nossa dor. Especialmente nas igrejas, infelizmente, há quase um preconceito contra quem demonstra tristeza - muitos apelam para o "deixa disso", sem tentar compreender o que o outro sente.

Minha amiga Márcia defendeu as pequenas tristezas:
Realmente, as grandes mágoas são mais fáceis de se lidar pq contam com a compaixão dos que nos rodeiam.
As pequenas mágoas são as mais difíceis... porque quem tá de fora não entende como uma coisinha dessa pode causar tanta dor, como uma situação acaba se repetindo tantas e tantas vezes e o fulano não aprende a conviver com aquilo...
É claro que quando a gente analisa, tem muitas pessoas em situação pior do que a nossa, o que traz um pouco de conforto (um conforto egoísta até), mas geralmente não cicatriza a nossa ferida.
Só que o que para os outros é uma "coisinha", uma coisa que já teria que ser aprendida, pra quem sente é muito diferente... é dor que paralisa, que apaga as estrelas e nos envolve na escuridão...
É nessa hora que as lágrimas dos que choram com a gente brilham... e começam a trazer as estrelas de volta.
Verdade: só quem é amigo mesmo entende as pequenas mágoas do outro. Só quem ama pode, com sinceridade, oferecer ouvidos pra ouvir e ombros pra chorar. Claro que o bom amigo também vai aconselhar, apontar quando nós mesmos provocamos o erro. Amigo não é aquele que assina embaixo de tudo o que a gente faz, mas é aquele que nunca diz "Eu te disse".

Já o Luiz, meu ex-companheiro de FABAT, acrescenta:

Acho que chorar com os que choram também é validar sua dor e seu direito de sofrer. Tantas vezes a gente se sente pequeno e desamparado, e ainda tem que viver num mundo que cultua a alegria, a força e a vitória. Chorar com os que choram é mostrar que está ok sofrer um pouco com a vida, ficar triste e sofrer derrotas. Que ser humano e limitado não é problema nenhum, e que estamos todos juntos nessa. Sem sentimentalismos, exageros ou citações bíblicas para tudo, sabe?
Não é de hoje que a tristeza e o sentimento de desamparo são criticados - Fernando Pessoa já falava disso no seu Poema em Linha Reta. Ninguém quer admitir fraqueza ou falta de fé, e nessa ânsia de ser super deixamos de ser humanos. Mas também existe um certo "preconceito" contra a alegria. Lendo o comentário do Luiz, me lembrei de uma discussão que rolou anos atrás na seção de cartas da Megazine (suplemento jovem do Globo), em que alguns poetas "engajados" criticavam os que escreviam poemas de amor: absurdo, falar de amor com tanta fome e injustiça no mundo!

Às vezes, tentando fugir do triunfalismo que nega a tristeza, caímos no erro de negar qualquer alegria. Como comemorar qualquer coisa, se há tanta gente que não tem nada para comemorar? Mas isso também é deixar de ser humano. Acredito no equilíbrio: nem me isolar no meu castelo onde nada de mal acontece, nem me desesperar e virar carpideira da humanidade; mas viver (e deixar que os outros vivam, e viver com os outros) a alegria e a tristeza, a dor e o prazer, o riso e a lágrima.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Dia da Verdade

Hoje, eu sentei à mesa com os líderes da minha igreja - meus líderes - e disse a verdade. Confessei minhas dúvidas sobre a Bíblia e a Palavra, e disse coisas nas quais normalmente até evito pensar. Admiti que todas as descobertas que fiz, que desafiam conceitos em que antes acreditava, não me chocaram - pelo contrário, amo cada dia mais o estudo bíblico-teológico. Fui absolutamente sincera, a ponto de me surpreender com o que saía da minha boca. Me dispus a deixar a minha amada igreja, para não correr o risco de machucar outros enquanto eu me entendo com estas dúvidas e questões.

E fui ouvida. Criticada? Sim. Disseram até que, se fossem eles meus pais, insistiriam comigo pra deixar o Seminário. Mas foram críticas temperadas com amor e compreensão. Mesmo na hora de expor as ideias mais terríveis, eles não me interromperam. Mesmo defendendo com emoção seu ponto de vista, eles não me marcaram como "herege". Mesmo depois de tudo o que apresentei, eles me convidaram a ficar. Não como alguém em "disciplina", mas como uma irmã.

Esta noite, na igreja, celebraram meu aniversário com bolo, orações, flores, muitos abraços e palavras de carinho. E eu só posso agradecer a Deus por ter encontrado pessoas tão dispostas a fazer valer o amor, acima de doutrinas, ideias e experiências.

Ainda sobre chorar com os que choram

Nos comentários, Harlyson Lopes Vieira perguntou:

O que é "chorar com os que choram" para ti?
Num sentido bem prático, chorar com os que choram (e se alegrar com os que se alegram) é pra mim se identificar com o sofrimento ou com a alegria de outra pessoa. Não é algo que se possa forçar, é fruto de amor - não do sentimentalismo, mas do compromisso de levar outro ser humano em consideração. É o antídoto do triunfalismo, porque mesmo quando recebo a maior das bênçãos eu me lembro dos que não foram ou não se sentem abençoados. É também o antídoto do pessimismo, porque mesmo na tragédia eu percebo que ainda há beleza no mundo.

Chorar com os que choram é deixar de ser Pollyanna, tentando ver motivos de riso até na boneca que nunca se ganhou de Natal. Tiago 5:13 diz: "Está alguém entre vós aflito? Ore. Está alguém contente? Cante louvores." Simples e claro, nada daquela bobagem de "Quem tem Jesus [...] está sempre sorrindo, mesmo quando não dá". Nas palavras de um sábio comentarista da JUERP: "Sorrir mesmo quando não dá? Não dá!" Como já disse um outro sábio, muito antes, "Há tempo de chorar e tempo de rir".

Se alegrar com os que se alegram é deixar de ser como a hiena do desenho. Tristeza não tem fim, e muitas vezes a gente cede à tentação de achar que nada dá certo, que Deus se esqueceu... Não estou falando, claro, das grandes dores, mas das decepções cotidianas, daquelas mágoas que vistas de longe parecem ínfimas, mas que são intensas pra quem sente (dor-de-cotovelo, por exemplo, ou a milésima promoção perdida para alguém menos capacitado).

Enfim, chorar e alegrar-se mutuamente é reconhecer o belo e o feio da vida. Nas palavras do Sergio Pimenta, é amar o seu próximo "como se a dor que ele sente fosse a que sente você".

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Bienal do Livro 2009: Notas Rápidas

  • Pra quem tem livros "encostados", a dica é passar no estande da Estante Virtual, no Pavilhão Verde, que está promovendo um troca-troca. Mas atenção: a troca é limitada a 10 livros por pessoa, e tem fila, claro!
  • Leve seu próprio lanche ou se prepare para gastar R$4,00 em comida sem graça (pelo menos o crepe estava bem mais ou menos). Segundo o Globo, o cachorro quente só com pão e salsicha sai por R$6.
  • Visite a Floresta dos Livros no Pavilhão Verde. É bacana, lembra um pouco o Museu da Língua Portuguesa.
  • Nerds de plantão: levem suas máquinas fotográficas e passem no estande da Panini, no Pavilhão Azul. Um certo grandalhão verde e mal-humorado espera por vocês lá.

domingo, 13 de setembro de 2009

Da arte de chorar com os que choram (cont.)

Dois amigos responderam ao meu último post com perguntas. Seguem minhas réplicas (com espaço para tréplicas e "quatréplicas", claro).

O primeiro comentário é do Harlyson, meu colega de turma na FABAT:

Para complicar, devo me tolher pelo outro? Ele deve se tolher por mim? E a liberdade? Se não demonstro minha alegria quando estou alegre porque isto pode ferir o outro que chora, então sou honesto? Poderia dizer "amigo,estou alegre por isso e isto, mas agora chorarei contigo, depois tu deixarás a tristeza ir embora e te alegrarás comigo". Mas se o outro não aceitar? Se a dor do outro permanecer mais tempo do que suportamos?
Não posso esperar que a dor ou a alegria do outro dure só o tempo que eu consigo "suportar". Acho que o que precisamos é de sensibilidade para não transformar a minha dor ou a minha alegria na coisa mais importante do mundo, na única coisa que vale. Imagine, por exemplo, que um ônibus escolar sofra um acidente. Algumas crianças morrem, outras são salvas. É óbvio e natural que os pais que perderam seus filhos sofram (e essa não é uma dor que suma rápido...), assim como é natural é óbvio que aqueles que receberam seus filhos de volta comemorem muito. A questão é: nem os que se entristecem (com razão!) podem se esquecer dos que se alegram, nem os que se alegram (com razão!) podem se esquecer dos que se entristecem. A alegria terá sempre uma ponta de tristeza, e a tristeza, uma ponta de alegria.

O outro comentário é do Ed Carlos, meu ex-companheiro na PIB de Botafogo:

Oi I, o texto me fez refletir algo que estive pensando dia desses... Há nas igrejas evangélicas, inclusive nas lideranças, homossexuais que não se manifestam como tal e lá permanecem cultuando a Deus.
Uma questão sobre pré-julgamentos: você acredita na salvação de membros da igreja católica?
Sobre os homossexuais: acho triste que eles precisem esconder sua condição para serem aceitos nas nossas igrejas...
Quanto à salvação dos membros da Igreja Católica: é uma pergunta espinhosa. Sou daquelas que acreditam que vamos nos surpreender muito com quem encontraremos (ou não) no Céu. E não me apego mais a doutrinas... Acredito sim, na salvação de membros da IC. Só não me pergunte de quais :-)

Mais comentários?

domingo, 6 de setembro de 2009

Da arte de chorar com os que choram

No último dia 21 de agosto, a Igreja Luterana Evangélica dos EUA (ELCA, na sigla em inglês), decidiu aceitar que homossexuais em relacionamentos estáveis assumam ministérios - inclusive o pastorado. Obviamente, muitas discussões precederam as votações. A pastora Nadia Bolz-Weber, líder da igreja House for All Sinners and Saints (Casa para Todos os Pecadores e Santos), uma das participantes, registrou suas impressões num sermão baseado em João 6.56-69, que pode ser lido no blog Sarcastic Lutheran.

A descrição que Nadia faz da assembleia lembra bastante qualquer reunião onde um assunto polêmico é discutido: discursos inflamados (mas nem sempre inspirados) de ambos os lados, e a sensação clara de que eu é que estou certo, e de que, se Jesus estivesse entre nós, certamente estaria do meu lado. Mas eis que um orador toma timidamente a palavra e, antes de qualquer coisa, confessa estar apavorado, tremendo de medo de falar, e pede que orem por ele. E o homem ao seu lado, que defendia o ponto de vista oposto, simplesmente pôs a mão em seu ombro e orou enquanto ele falava.

Este gesto simples fez Nadia humildemente reconhecer: por mais que ela e sua comunidade tivessem, sim, o direito de celebrar a vitória, não poderiam esquecer aqueles que perderam. Jesus não está nem "do lado deles" nem "do nosso lado", ele está no meio oferecendo a todos perdão. Nossas convicções, crenças e interpretações da Bíblia são importantes, mas não são as palavras da vida eterna. Mas é tão difícil deixar de confundir estas coisas...

Há muito tempo me sinto desafiada por (e intrigada com) Romanos 12.15: "Alegrai-vos com os que se alegram, chorai com os que choram". É um conselho simples na aparência, mas quando se vive em comunidade é inevitável que os momentos de tristeza venham junto com os momentos de alegria: Maria passou no vestibular, Pedro perdeu o avô. Pode Pedro rir com Maria, e Maria chorar com Pedro?

O sermão da pastora Nadia me apresenta um novo desafio: como agir quando a minha alegria é a causa da tristeza do outro? Criticamos o conservadorismo ou o liberalismo dos outros, e acabamos nos esquecendo de que eles não são só um bando de fundamentalistas estraga-prazeres, nem um monte de loucos rasgando Bíblias: dos dois lados há pessoas que procuram ser fiéis a Deus, que se entristecem profundamente com o que consideram ser desvios da "sã doutrina". Meu copo de vinho ou minha saia comprida valem mais do que estas pessoas?

Pode Pedro rir com Maria, e Maria chorar com Pedro, se é a alegria dela que fere seu irmão?

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Perguntas em busca de respostas

É estranho ver minhas certezas se desmanchando no ar... E mais estranho ainda é ver que boa parte delas está indo embora sem muita dor - me faz pensar se eram, de fato, certezas. E o que mais dói não é perdê-las, é perceber que não tenho outras para substituí-las.

Antes de começar o curso de Teologia, resolvi fazer uma suspensão de descrença invertida (pra quem não conhece o termo: suspensão voluntária de descrença é aquilo que faz você acreditar que o Henrique VIII tinha a cara do Jonathan Rhys Meyers). Na minha "suspensão de crença", decidi não me apegar a tudo que aprendi em quinze anos de Igreja. Guardei a fé em um Deus criador e em um cara chamado Jesus que andou pela Palestina de 2000 anos atrás; e deixei o resto em aberto. E, agora, cadê as certezas que estavam aqui?

Esta semana, durante uma aula de Filosofia da Religião (em que eu não estava lá prestando muita atenção, admito), comecei a anotar uma série de perguntas:

  • Se não há vida após a morte, ela é necessariamente inútil?
  • Se não há Deus, não há sentido? Se não há Deus, não há moral?
  • O que queremos dizer, quando indagamos sobre o "sentido" da vida? A vida precisa ter sentido?
  • Nascer, crescer, sentir, se relacionar, morrer - isto é pouco? Tocar e ser tocado por outras pessoas, é preciso mais sentido do que isto?
A terceira me lembra um poeminha que escrevi no segundo grau ("A vida tem sentido? Se tem, pra onde?"). Mas ainda não consigo articular estas questões, transformá-las em texto, tirar delas, se não certezas, pelo menos uma linha de pensamento minimamente coerente. Inspirada, então, no meu colega Renato Fontes e em suas Perguntas Retóricas, vou deixando registrados os meus questionamentos. Não são retóricos, mas ainda estão em busca de respostas...

domingo, 23 de agosto de 2009

Moral?

Se não há Deus, não há moral? A moral tem que ser, necessariamente, resposta a uma entidade superior a mim? Por que a moral não pode ser resposta ao ser humano diante de mim?

Este vídeo é antiguinho, mas interessante (está em inglês, sem legendas):



Confesso: eu quero dar uns tabefes na apresentadora loura. Grupos ateístas espalharam cartazes anti-religião em cidades americanas. Os cartazes foram roubados, e os grupos decidiram substituí-los por cartazes dizendo "Não roubarás". A loura fica indignada: "Ah, é, somos ateus, mas vamos usar um dos dez mandamentos para nos justificar". Hum... Quem roubou os sinais, muito provavelmente, foram cristãos (note que ninguém nega essa possibilidade, a própria colunista convidada recomenda que os cristãos NÃO façam isso). Ora, não somos nós que adoramos esfregar a moral na cara dos outros? Por que os outros não teriam direito de devolver isso, quando nós mesmos agimos contra essa moral?

Mas a loura continua: "Se não lutarmos, o cristianismo pode desaparecer". Difícil acreditar que alguém realmente creia nisso, que uma das maiores religiões do mundo pode sumir do mapa simplesmente porque algumas pessoas espalharam cartazes contra ela. E, mesmo que isto fosse possível, será que isto justifica agirmos contra os nossos próprios padrões?

Por enquanto, fico por aqui. Comentários?

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Cover de Thriller, do Michael Jackson



Este é um dos meus covers favoritos. O clima voz-e-violão me fez prestar mais atenção na letra e deixou a música mais assustadora... Ah, sim, o cantor é Ben Gibbard, das bandas Death Cab for Cutie e The Postal Service (Such Great Heights, disponível no My Space e no site oficial, é uma das músicas mais fofas que já ouvi!).

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Arte com Livros


Tem mais aqui. Esta é minha favorita!

Dica do Moreno, um dos Bibliotecários sem Fronteiras.

Igreja Ateísta



Dica do Harlyson.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Biblioteca Viva na Mostra Puc

Deu no Globo: PUC-Rio procura voluntários para a primeira Biblioteca Viva do Brasil

A ideia é simples e muito interessante: "pessoas que sofrem algum tipo de discriminação e preconceito viram livros vivos e contam suas histórias aos leitores durante os trinta minutos de 'empréstimo'". Para quem quiser conferir, a próxima Mostra PUC acontece entre 25 e 28 de agosto que vem.

Aliás, a ideia bem que poderia ser adaptada para outros eventos, não?

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quinta-feira, 23 de julho de 2009

terça-feira, 21 de julho de 2009

Diário de Viagem: Bonito

No começo deste mês, participei do XXIII Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação (CBBD) em Bonito-MS. Foi meu primeiro congresso profissional desde que saí da faculdade - até então, eu só tinha participado de eventos específicos sobre informação em saúde promovidos pelo Ministério da Saúde ou pela Bireme. E, claro, eu não podia perder a oportunidade de fazer um pouco de turismo também :-).



O envento aconteceu no Centro de Convenções de Bonito, o da foto aí em cima. A melhor parte, para mim, foi (re)encontrar colegas que, como eu, faziam a transição dos encontros de estudantes (nossos queridos ENEBD's) para eventos mais "adultos". Por outro lado, senti falta de ter um trabalho pra apresentar - até tentei, mas faltou tempo pra pensar no começo deste ano. E o fato de ser a única responsável pelo andamento da biblioteca onde trabalho me atrapalhou na hora de escolher palestras e trabalhos para assistir. Quem cuida de tudo acaba não se especializando em nada... Mas, no geral, o Congresso teve apresentações interessantes, especialmente na área de acessibilidade. Fiquei especialmente impressionada com as iniciativas da Universidade Federal de Sergipe e da Biblioteca Pública do Espírito Santo.



Difícil falar de Bonito sem escapar dos trocadilhos infames: é um lugar que está à altura do nome. Os organizadores do CBBD levaram isso em conta e deixaram as manhãs relativamente livres: nada de apresentações de trabalho nem de palestras gerais, apenas alguns Workshops para públicos específicos. Assim, todo mundo teve tempo de aproveitar alguns dos passeios. Há opções para a maioria dos bolsos, os guias e motoristas são bem-preparados (e não tem aquela "esmolinha" no final, os preços são todos tabelados), a infra-estrutura vai de boa a ótima (um detalhe que me impressionou foram os banheiros, sempre limpos e bem-conservados - até nas atrações da Prefeitura). Vale a pena visitar Bonito!

No Balneário Municipal, minha primeira parada, nadei com os piraputangas (peixes-símbolo de Bonito), vi araras e outros bichos, tomei suco de guavira (é doce, mas não enjoativa). É um lugar bacana, mas não tem nada de extraordinário.

Meu segundo passeio foi descer de bote o Rio Formoso, um dos principais da região (outros incluem o Sucuri, o Rio da Prata, o Mimoso...). Descer as cascatinhas deu um frio na barriga, mas o que me molhou mesmo foram as guerrinhas de água entre os botes. Os remadores são os piores, mas teve um adolescente num outro bote que também fez um estrago. (sinal de velhice: reclamar de adolescentes...)

Terminado o CBBD, sobrou tempo para passeios mais longos. Mas a chuva que caiu a noite toda no último dia do Congresso foi um banho de água fria... Fiquei com medo de ter gasto dinheiro à toa quando troquei a passagem. Eu já tinha agendado a flutuação no Rio da Prata para o dia seguinte, que amanheceu nublado... O passeio estava marcado para as nove e meia, mas atrasou por falta de guia - e o dia continuava nublado. Mas a chuva parou, encontraram uma guia, e lá fomos nós (eu, dois casais, duas amigas viajando juntas e mais duas mulheres viajando sozinhas).

Flutuações (descer um rio usando máscara, snorkel e roupa de neoprene, para ver os peixes) são um dos passeios indispensáveis de Bonito. Escolhi a do Recanto Ecológico do Rio da Prata por já ter recebido o prêmio "Escolha do Leitor" do Guia 4 Rodas. E, de fato, eles não estavam errados... Para chegar à nascente, fizemos uma caminhada de uns 40 minutos por uma trilha limpa e bem-sinalizada (árvores típicas são assinaladas e há plaquinhas informativas sobre animais que circulam por ali). Mesmo com a chuva interminável do dia anterior e com o tempo nublado, a água da nascente continuou cristalina. Em 1h30 de flutuação, vi piraputangas, pacus, dourados (um deles passou bem na minha frente, lindo!), passei bem no meio de um cardume... Alguns pontos são bem rasos, o que me deixou inquieta: a sensação era de que eu ia deitar no fundo do rio. Um ponto tem uma corredeira - o grupo sai do rio neste trecho, mas volta logo antes de uma curva cheia de pedras que é a mais emocionante de se passar.

Não flutuamos no Rio da Prata propriamente dito porque, ao contrário da nascente, as águas estavam turvas. Mas a maior surpresa veio quando estávamos no transporte de volta para o receptivo, onde o almoço nos esperava... A guia estava conversando tranquilamente quando sua expressão mudou: lá longe, uma onça parda corria de volta pra mata! Ela era enorme, linda, e muito rápida. Se eu tivesse piscado, não teria visto (e, de fato, duas pessoas não viram...) A cereja no bolo foi saber que nossa guia esperou 15 anos por aquele momento. Claro que ficamos nos gabando do nosso pra todo mundo!

No dia seguinte, fomos (o grupo era praticamente o mesmo!) à Estância Mimosa, fazenda que se destaca pelas cachoeiras e pelo almoço farto e delicioso. Depois de comer e de passar um tempo à beira de um lago na companhia dos gansos, de uma garça e de um jacaré-do-papo-amarelo (mais assustador que a onça...), descemos a trilha para conhecer as cachoeiras. Como o lugar já tinha sido explorado por madeireiros, a mata ainda está em recuperação. Mesmo assim, há bastante coisa pra se ver, e as cachoeiras são lindas. Como o dia estava frio, só me animei a mergulhar na última que visitamos, a do Sinhozinho. Uma pedra estrategicamente localizada, bem abaixo da queda, é o ponto ideal para receber uma bela massagem nas costas... Voltamos pouco antes de escurecer, e ainda fizemos um lanche antes de ir. O guia foi no carro com a gente até a cidade, e foi aquela festa: piadas, histórias e até relatos sobre assombrações que vagam por Bonito guardando tesouros da época da Guerra do Paraguai - segundo a lenda, luzes e sonhos indicam os locais onde estão enterrados os tais tesouros para alguns poucos escolhidos.

Nesta noite, caminhando até a cidade sozinha para a janta, topei com mais uma surpresa: uma festa julina no meio da rua, promovida por uma escola da cidade. Me diverti com as quadrilhas (especialmente com as "damas" que eram cavalheiros, e vice-versa), comi pastel, tomei chocolate-quente... Voltei pro albergue pronta pra cair na cama.

Na manhã seguinte, finalmente visitei a Gruta do Lago Azul, cartão-postal principal de Bonito. A trilha é bem escorregadia, mas nada que impeça crianças e idosos de curtir o passeio. Os guias dão todos os detalhes: o mergulho é proibido para preservar uma espécie única de crustáceo que vive no lago; a melhor época para visitar é em dezembro-janeiro; o ideal é tirar fotos sem flash; no fundo do Lago foram encontradas ossadas de uma preguiça-gigante e de um tigre-de-dentes-de-sabre... Mas o que importa é que a Gruta é linda. Perto da Gruta do Lago Azul, mas menos disputadas, as Grutas de São Miguel também valem a visita.

À tarde, fiz arvorismo no Hotel Cabanas - pra chegar lá, andei de moto pela primeira vez. Encontrei uma outra bibliotecária por lá, e fomos muito zoadas pelos guias por sermos "cariocax" :-) A recepcionista do albergue tinha dito que o passeio do Hotel era o mais leve dos três arvorismos disponíveis, mas foi emoção suficiente para mim. A tirolesa é a melhor parte, e a vista é maravilhosa! Ainda tivemos um presente: dois tucanos passaram voando antes de irmos embora...

No último dia, optei por um passeio a cavalo no Parque Ecológico do Rio Formoso. Foi muito melhor do que eu esperava - o grupo era divertido, o guia era uma figura (ele ainda nos serviu tereré, um espécie de chimarrão gelado típico do MS), o cavalo era mansinho e o lugar, maravilhoso.

Bonito é, sem dúvida, um destino ecológico, não só pelas atrações. A cidade faz coleta seletiva, há tratamento de esgoto, as ruas são limpas e bem-conservadas. Dá pra ver que o dinheiro do turismo (e da agropecuária, que ainda é a principal fonte de renda do município) está sendo bem aplicado.

Para comer, a opção básica é peixe. A carne de jacaré é super-popular, aparece até em sanduíches e pastéis. Provei um prato com jacaré à dorê, uma delícia! Experimentei também picolés de frutas típicas (não lembro os nomes, mas uma era azedinha como cajá, e a outra, doce como leite condensado), geléia de azeitona, e um chocolate-quente com licor de guavira - nada muito forte, só o suficiente para espantar um pouco o frio.

Durante o Congresso, fiquei hospedada numa pousada no centro (Paraíso das Águas), o que é uma mão-na-roda - você não precisa de transporte nem caminhar muito para encontrar um lugar pra comer ou fazer compras. Por outro lado, a pousada fica bem em frente ao Taboa, único bar da cidade com música ao vivo depois das 23h. Não chegou a prejudicar meu sono, mas também não ajudou...

Depois, me transferi para o Albergue de Bonito. Estava com o pé atrás por causa das milhares de informações e recomendações que eles despejam na página - parecia mais um acampamento de igreja do que um albergue... Mas o lugar é agradável e bem cuidado, e encontrei pessoas bacanas do Brasil e do mundo - até da República Tcheca (e viva as aulinhas de inglês)!

Enfim, já escrevi à beça. Acho que esta foi a melhor viagem que fiz até hoje - com certeza foi a que mais proporcionou experiências novas! Mais fotos no Picasa:

sábado, 18 de julho de 2009

Na Rede (2) - Cara, cadê meu livro??

Deu no New York Times: alguns usuários do Kindle (o leitor de e-books da Amazon) acordaram dia desses sem alguns dos livros que compraram e com um crédito correspondente ao valor gasto nas suas contas. A explicação só veio depois: aparentemente, as edições adquiridas foram vendidas irregularmente. A notícia foi comentada pelo colunista David Pogue, pelos usuários do Kindle (claro!), e em sites como o Current.com, onde topei com a notícia.

Não vou entrar na discussão "papel versus e-books". O que é estranho nesta história é que a gente costuma ver os e-books como a evolução do livro tradicional: são mais ecológicos (não derrubam árvores), mais práticos (adeus, estantes - e armários, e gavetas - abarrotadas!), o futuro. Até aí, tudo bem. Por outro lado, você não pode emprestá-los, não pode revendê-los (adeus, sebos?), não pode fazer Bookcrossing com eles. E, pra piorar, descobrimos da pior maneira que a livraria ou editora pode simplesmente tomar de volta o que já foi comprado!

Vocês devem se lembrar do processo que o Roberto Carlos ganhou, impedindo que uma biografia sua continuasse sendo comercializada. Imaginem se, em vez de se limitar a recolher os exemplares não vendidos, a Saraiva (ou a Cultura, ou o Submarino, enfim, sua livraria de escolha) mandasse alguém invadir a sua casa quando você não estivesse olhando, levasse o livro da sua estante e deixasse um cheque na mesa da sala antes de sair? Dizer que as cópias vendidas aos usuários do Kindle não eram legais é desculpa esfarrapada. A negociação entre os usuários e a Amazon foi legítima, ninguém estava pirateando nada - até porque, se pirateassem, não teriam direito a reembolso, né? Quem errou foi a Amazon, que vendeu mercadoria sem ter certeza de sua origem. Ou não?

A ironia das ironias? Os livros "retirados" foram 1984 e A Revolução dos Bichos (Animal Farm), de George Orwell. Big Brother IS watching you - e ele vai levar seus livros!

***

Para animar, tem filminho novo da Pixar na área: Partly Cloudy (Parcialmente Nublado, na minha tradução) brinca com a velha lenda sobre cegonhas que entregam bebês. No caso, as cegonhas "trabalham" para nuvens que moldam e dão vida a filhotes de todas as espécies... É fofo :-) A estreia oficial será junto com o novo longa da produtora, Up.

sábado, 20 de junho de 2009

Questão de Princípio

Participei recentemente de um mini-curso sobre os Princípios Batistas, ministrado pelo prof. Osvaldo Luiz Ribeiro e promovido pelo Centro Acadêmico Dr. Shepard do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. Como tivemos apenas quatro encontros, não trabalhamos os Princípios exaustivamente. O prof. Osvaldo preferiu realçar alguns pontos que revelam a influência do liberalismo inglês do século XVII sobre aqueles primeiros batistas. Um dos trechos trabalhados discute o governo da igreja e, em certo ponto, afirma: "Nem a maioria, nem a minoria, tampouco a unanimidade, reflete necessariamente a vontade divina".

Se resolvermos seguir este princípio, temos que admitir que nenhum grupo - e nenhum indivíduo - tem respaldo quando afirma conhecer a vontade de Deus. A partir desta constatação, o professor propôs um pequeno exercício de reflexão: "E agora?" Dois alunos, eu inclusive, aceitamos o desafio. Os textos estão no blog Peroratio, junto com algumas considerações do Prof. Osvaldo. Eis o meu:

Se a vontade de Deus não é necessariamente expressa pela opinião da maioria, nem pela da minoria, e nem mesmo pela opinião de todos, estou isenta de buscar "vontades" específicas de Deus para a minha vida. Minhas decisões são minhas, com todo o bônus e o ônus que isso representa. Sou livre para decidir segundo o meu juízo, para voltar atrás quando errar (sem tentar culpar a Deus pelos meus erros), para assumir as consequências de meus atos. Ninguém decidirá por mim, e eu não decidirei por ninguém. Mas nem por isso estou totalmente sozinha: em vez de mentores que me indiquem O caminho, busco companheiros que me ajudem a fazer meu próprio caminho.

Saber que não há como ter certeza da vontade de Deus é assustador, especialmente para quem foi ensinado a buscar essa vontade e a segui-la. Por outro lado, e é esta a perspectiva que mais me atrai, é também libertador. Deus deixa de ser a Esfinge bloqueando o caminho, à espera que eu dê a resposta certa ao enigma ("Decifra-me ou devoro-te!"). Não há esfinge, não há um só caminho. Ou, como diz Antonio Machado, "Não há caminho - o caminho se faz andando". E não há uma só resposta ao enigma. Aliás, não deixa de ser curioso lembrar que a resposta ao enigma da esfinge é "o ser humano"...

Falar em uma Resposta me faz lembrar do Guia do Mochileiro das Galáxias. Segundo a série (que já foi programa de rádio, livro, seriado de tv, filme e até toalha), 42 é A Resposta para a Vida, o Universo e Tudo o Mais. O que ninguém sabe é qual é a pergunta... E, se a gente pensar bem, o que não falta por aí é resposta: amor, dinheiro, caridade, trabalho, religião, sexo, prozac, comunismo, anarquismo, capitalismo - tudo pode servir pra nos levar a auto-realização, à felicidade, à justiça social. Só falta decidir se o que a gente quer é auto-realização, felicidade, justiça social ou não sei o que mais - enfim, só falta saber qual é a pergunta. Ou, antes: falta encontrar uma resposta para cada pergunta que a vida me coloca. Cada situação é um desafio e uma oportunidade para escolher: com que roupa eu vou? Com quem eu vou? Pra onde eu vou? E como eu faço pra chegar lá?

Há desafios que são banais, como o de escolher se vou de ônibus ou metrô. Outros parecem mais assustadores do que são na verdade, como o Cavaleiro Negro de Em Busca do Cálice Sagrado - e, como o coelhinho do mesmo filme, alguns são bem mais perigosos do que parecem (Monty Python, Douglas Adams... O que seria de mim sem os humoristas ingleses??). Diante de cada desafio, grande ou pequeno, estamos sozinhos: a decisão final será sempre nossa.

Ser livre é ser só. Mas essa solidão não me satisfaz. É verdade que ninguém pode tomar minhas decisões por mim, e eu também me recuso a decidir por outros. Mas prefiro a opção do Drummond (ufa, um brasileiro!): "Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas". Quando li meu texto na última aula do curso, o Osvaldo comentou que dois perdidos não fazem um achado. Concordo. Mas vejo isso como uma advertência contra a ilusão de encontrar, em/com alguém ou com/num grupo, a resposta para a vida (e o universo, e tudo o mais). Abro mão dessa ilusão, mas não abro mão de compartilhar minha vida com outras pessoas. Se dois dormirem juntos, eles se esquentarão; mas como é que um só vai se esquentar? Ah, isso é Eclesiastes 4.11, só pra jogar um pouquinho de Bíblia também.

Encontrei por acaso esta tirinha, que tem a ver com tudo isso:

> Oi, eu estava me perguntando se você tinha planos pra -- Carambola, o que aconteceu com o seu apartamento?
> Eu enchi de bolinhas de plástico.
> Eu... O quê? Por quê?
> Porque nós somos adultos agora, e é a nossa vez de decidir o que isso significa.

É isso aí...

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Ouvindo: Jens Lekman - The Opposite of Hallelujah
via FoxyTunes

segunda-feira, 9 de março de 2009

Diário de Viagem: Buenos Aires

Hola!



Aproveitei o Carnaval para fazer minha primeira viagem ao exterior: Buenos Aires, Argentina. Fui sozinha: comprei a passagem um mês antes (em cima da hora: os voos de sabádo e domingo já estavam lotados) e reservei um albergue indicado pelo Lonely Planet: Hostel Suites Palermo. Fica num bairro afastado do centro, o que dificultou algumas coisas, mas gostei do clima tranquilo do lugar. Os outros albergues que consultei eram mais festeiros, um deles até avisava: "Se você gosta de dormir cedo, NÃO escolha este hostel". Segui o conselho :-)

Tudo certo pra viagem, bateu o frio na barriga: que é que eu vou fazer sozinha num país estranho (uma nação inimiga, pelo menos no esporte) e sem falar a língua do lugar (entendo o espanhol, especialmente lendo, mas não falo nada além daquele portunhol bem furreca)? Relaxei um pouco no avião, até porque adoro voar, mas foi só sair da checagem da imigração no aeroporto pra voltar o medo.

Caí num daqueles golpes de taxistas logo de cara: o motorista me cobrou 178 pesos por uma viagem que, na volta, saiu por 90 - sim, quase o dobro! Boa parte dos meus pesos foi embora nessa transação... Mas me informei na recepção do albergue e descobri que poderia trocar meus dólares (na hora de fazer o câmbio, troquei uma parte em pesos pro táxi e o resto em dólares) num lugar perto.

Deixei a mala e a mochila no quarto (me impressionei com a bagunça que as outras meninas fizeram) e saí para comer alguma coisa. Andei algumas quadras até o café Tonno, onde comi uma pizza - veio meio queimada, mas os pepperones eram maravilhosos - e observei os locais. Um grupo de adolescentes deu lugar a um casal com três filhos, a primeira prova da alta taxa de natalidade argentina (segundo o Lonely Planet, a mais alta da América Latina). Tem criança para todos os lados em BA! A determinada altura os funcionários mudaram o canal da TV para assistir a Hombre al Agua, uma espécie de gincana só com provas aquáticas (lembrei das Olimpíadas do Faustão). Tentei assistir até o final, mas era looongoooo e o sono venceu. Na hora de pagar, segundo susto: o cartão de crédito não liberou a compra. Fiquei apavorada na hora. Agora, trocar os dólares parecia questão de vida ou morte...

Segundo dia: liguei o notebook antes de sair do albergue e, por via das dúvidas, paguei a fatura do cartão de crédito e chequei a liberação para uso no exterior do cartão. Depois fui procurar a tal casa de câmbio. Tomei um novo susto porque não a encontrei no lugar que me indicaram, mas segui em frente: estava na Av. Santa Fé, uma das principais de Buenos Aires, e achei que deveria ter algum lugar onde eu pudesse trocar o dinheiro por ali. Finalmente encontrei: problema n. 1 resolvido!

Almocei num restaurante simpático. Confesso que me decepcionei um pouco: todo mundo fala tanto das carnes argentinas que eu, carnívora assumida, estava com água na boca para provar. Só que, aparentemente, tempero não é o forte dos hermanos... Só comi carne sem sal lá, uma pena. Mas as papas fritas estavam deliciosas!

Passei o resto da tarde explorando Palermo, um bairro de classe-média alta, arborizado e com uma vida noturna agitada. Minha primeira parada foi o Zoo, onde aproveitei para testar o cartão de crédito. Compra autorizada! Finalmente tranquila, curti bastante o passeio: show de lobos marinhos, ursos, felinos, girafas, lhamas, elefantes... E muitos, muitos turistas, especialmente brasileiros: na fila, alimentando os animais (o próprio zoológico vende um preparado especial para isso), tirando fotos, passeando.

Conferi no guia da Folha de São Paulo (se você pretende ir a BA, recomendo muito esse guia: os mapas são valiosos e o tamanho é ideal pra levar na bolsa) o endereço da Persicco, uma das mais badaladas sorveterias portenhas. Tomei um cucurucho (casquinha) de dulce de leche casero. A primeira surpresa: a porção é extremamente generosa, praticamente o dobro do sorvete do lado de fora - enche os olhos e a boca, mas não é muito prático na hora de tomar. A segunda: o tal sorvete de doce de leite não é enjoativo! E a terceira: a casquinha tinha umas três ou quatro camadas, uma delícia. Nota 10 para o helado.

Finalizei a tarde numa das muitas praças de Buenos Aires, vendo casais, famílias e grupos de amigos jogados na grama, um carinha treinando malabares, crianças bricando (dois meninos na minha frente faziam mountain bike num buraco de uma quadra), cachorros (outra paixão portenha - vi vários "andadores" de cachorro segurando vários pelas correntes), gente jogando futebol ou bebendo mate, uma delícia. O sol só se põe pra lá das oito horas, e ao que parece eles aproveitam cada minuto antes que isso aconteça. Voltei para o albergue, não sem antes traçar uma omelete num restaurante.

O terceiro dia começou bem cedo, com um city tour. Saímos do parque onde se encontra a bela Floralis Generica e percorremos Palermo e os bairros mais centrais até a Plaza de Mayo, ponto de protesto famoso e onde fica a Casa Rosada. Depois, fomos a La Boca, lar da Bombonera (estádio do Boca Juniors, ex-time de Maradona - até estátua do Diego tem lá) e de Caminito, ruazinha famosa pelas fachadas coloridas e os artistas de rua - muito careiros, por sinal.

O tour me deixou em Puerto Madero, talvez o lugar mais charmoso que vi em BA (o páreo é difícil, Palermo e a Recoleta são maravilhosos). Caminhei até não poder mais pelo calçadão à beira do rio, almocei no restaurante Siga La Vaca - parilla estilo "coma-o-quanto-puder" - em uma ponta e fui até a Freddo, na outra ponta, (outra sorveteria chique) tomar um helado de framboesa. No meio do caminho, visitei a Fragata-Escola Sarmiento e morri de inveja dos estudantes da Universidade Católica de BA, que estudam num lugar daqueles. Será que tem Teologia lá? Ah, sim, Puerto Madero também estava lotado de brasileiros, no Siga La Vaca uma família estava especialmente barulhenta :-)

Caminhei até o centro e fiz um pit-stop no shopping Galerias Pacífico, que tem afrescos lindos no teto. Dali segui pela Calle Florida (espécie de Uruguaiana portenha) até o metrô, ou Subte - de subterrâneo, reparou? - e voltei para "casa". Naquela noite saí para o Tango Experience, evento promovido pela rede Hostel Suites. A aventura começa no Hostel Suites Florida (um dos albergues mais bacanas que já vi, e bem central - fica na Calle Florida) com uma taça de vinho e, pelo menos naquela ocasião, alguma música (tocada num violino por um barbudo gordinho de bermuda). Não me aventurei a tomar uma taça inteira, mas provei uns golinhos.

Do ponto de encontro saímos, apertados numa van, para uma aula de tango - não aquele de filme, com rosas e vestidos decotados, mas o tango das milongas, que gente de verdade dança. A professora era ótima, e o grupo estava bem descontraído (culpa do vinho, talvez?), o que deixou tudo mais divertido. De volta para a van, fomos para uma pizzaria, e aí o papo rolou solto. Brasileiros, claro: duas cariocas - eu e mais uma, chamada Janaína (a rainha da água doce encontra a rainha do mar) - e dois gaúchos, um francês que fala português, um italiano, um holandês, uma inglesa, um irlandês, um chileno... Uma verdadeira babel :-)

Pra fechar a noite, visitamos uma milonga. A ideia era testar os conhecimentos, mas poucos se aventuraram na pista de dança - eu entre eles, duas vezes! Pena que não tenho as fotos para comprovar, mas tive testemunhas. Dancei mal, lógico, mas quem liga? E pelo menos não pisei no pé dos meus pares, já considero uma vitória :-)

Quinta-feira, último dia inteiro em BA. Caminhei quadras e mais quadras na Av. Santa Fé, de Palermo até a Recoleta, para conhecer El Ateneo Grand Splendid, uma das livrarias mais bonitas do mundo. O prédio era um cine-teatro, e os novos donos fizeram intervenções mínimas para instalar a livraria, mantendo os balcões e o espaço do palco. Foi ali que almocei um belo (e insosso, nada que um salzinho não ajudasse) bife de chorizo.

Dali, caminhei mais um tanto até a Recoleta, onde visitei a Igreja de N.S. do Pilar (que tem um pequeno museu), o famoso Cemitério onde está enterrada Evita, e o Museu de Belas-Artes, com uma coleção invejável. Numa praça, um grupo ensaiava técnicas de circo - malabares, corda bamba, etc. Jantei por ali, e, no caminho até o subte, vi um legítimo panelaço contra a troca de mão de uma avenida.

Ufa! A sexta foi só para arrumar a mala, comprar uma lata de alfajor (devorados pela minha irmã em menos de uma semana) e ir ao aeroporto, lotado - tinha uma fila gigantesca pra passar pelos detectores de metal! E você ainda tem que pagar uma taxa pelo uso do espaço... De volta para casa! Agora, é planejar a próxima viagem...

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