domingo, 6 de setembro de 2009

Da arte de chorar com os que choram

No último dia 21 de agosto, a Igreja Luterana Evangélica dos EUA (ELCA, na sigla em inglês), decidiu aceitar que homossexuais em relacionamentos estáveis assumam ministérios - inclusive o pastorado. Obviamente, muitas discussões precederam as votações. A pastora Nadia Bolz-Weber, líder da igreja House for All Sinners and Saints (Casa para Todos os Pecadores e Santos), uma das participantes, registrou suas impressões num sermão baseado em João 6.56-69, que pode ser lido no blog Sarcastic Lutheran.

A descrição que Nadia faz da assembleia lembra bastante qualquer reunião onde um assunto polêmico é discutido: discursos inflamados (mas nem sempre inspirados) de ambos os lados, e a sensação clara de que eu é que estou certo, e de que, se Jesus estivesse entre nós, certamente estaria do meu lado. Mas eis que um orador toma timidamente a palavra e, antes de qualquer coisa, confessa estar apavorado, tremendo de medo de falar, e pede que orem por ele. E o homem ao seu lado, que defendia o ponto de vista oposto, simplesmente pôs a mão em seu ombro e orou enquanto ele falava.

Este gesto simples fez Nadia humildemente reconhecer: por mais que ela e sua comunidade tivessem, sim, o direito de celebrar a vitória, não poderiam esquecer aqueles que perderam. Jesus não está nem "do lado deles" nem "do nosso lado", ele está no meio oferecendo a todos perdão. Nossas convicções, crenças e interpretações da Bíblia são importantes, mas não são as palavras da vida eterna. Mas é tão difícil deixar de confundir estas coisas...

Há muito tempo me sinto desafiada por (e intrigada com) Romanos 12.15: "Alegrai-vos com os que se alegram, chorai com os que choram". É um conselho simples na aparência, mas quando se vive em comunidade é inevitável que os momentos de tristeza venham junto com os momentos de alegria: Maria passou no vestibular, Pedro perdeu o avô. Pode Pedro rir com Maria, e Maria chorar com Pedro?

O sermão da pastora Nadia me apresenta um novo desafio: como agir quando a minha alegria é a causa da tristeza do outro? Criticamos o conservadorismo ou o liberalismo dos outros, e acabamos nos esquecendo de que eles não são só um bando de fundamentalistas estraga-prazeres, nem um monte de loucos rasgando Bíblias: dos dois lados há pessoas que procuram ser fiéis a Deus, que se entristecem profundamente com o que consideram ser desvios da "sã doutrina". Meu copo de vinho ou minha saia comprida valem mais do que estas pessoas?

Pode Pedro rir com Maria, e Maria chorar com Pedro, se é a alegria dela que fere seu irmão?

2 comentários:

Harlyson Lopes Vieira disse...

Ótima postagem.

Já estava a me perguntar por onde estaria a Iara que não mais se importava com este blog...

Para complicar, devo me tolher pelo outro? Ele deve se tolher por mim? E a liberdade? Se não demonstro minha alegria quando estou alegre porque isto pode ferir o outro que chora, então sou honesto? Poderia dizer "amigo,estou alegre por isso e isto, mas agora chorarei contigo, depois tu deixarás a tristeza ir embora e te alegrarás comigo". Mas se o outro não aceitar? Se a dor do outro permanecer mais tempo do que suportamos?

...

ED Carlos disse...

Oi I, o texto me fez refletir algo que estive pensando dia desses... Há nas igrejas envagélicas, inclusive nas lideranças, homossexuais que não se manifestam como tal e lá permanecem cultuando a Deus.
Uma questão sobre pré-julgamentos: você acredita na salvação de membros da igreja católica?

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